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terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Anotações de um barzinho


     A noite começou depois de um dia bem agitado... Escuto daqui o murmuro de alguns casais, o som da guitarra ligada na pedaleira seguida de uma voz masculina, uma leve microfonia de início de bar.
     Na minha mesa, alguns palitos, uma lata vazia, restos de petiscos, um caderno pequeno, uma caneta azul... Os Novos Baianos “alguma coisa acontece no meu coração”, é o trecho que toca agora. Olho pra você e solto um sorriso bobo de quem diz “te quero agora, mas o momento tem de ser respeitado”. Você sorri de volta, querendo saber o que escrevo... Dei uma pausa junto com o fim desse som e agora escuto uma voz feminina e doce... Tiro do bolso um isqueiro verde e uma carteira de cigarros de palha... Olho para o chão e vejo duas garrafas de água mineral, alguns fios, pedestais e logo às minhas costas, algumas pessoas chegando aos poucos, encorpando este lugar. Vou pedir uma cerveja para matar o tempo, enquanto daqui vou olhando aos poucos e com a intensidade forte de sempre.
     Um som não nacional, outro da terra... Cheiro de frituras, coceira no bigode, algumas palmas, pausas, sorrisos... A música que marcou uma passagem muito importante da minha vida: “você, é algo assim...”.
      “... simplesmente exalam, o perfume que roubam de ti...” e uma gargalhada histérica do outro lado de quem já tomou algumas e outras. E “... meu coração, não sei por que, bate feliz quando te vê...” .
     Esqueci as cervejas...
     Uma moça simpática tirou a minha concentração: “bombom caseiro?”.
- Não, não... Muito obrigado.
- Eu que agradeço a atenção.
     Chegamos às três páginas deste caderninho e não paro de pensar o quanto essas músicas respondem aos nossos momentos juntos.
     A bebida chegou...
 “... vamos fugir deste lugar baby...”.


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PARTE II
 (depois da cerveja)
     “... Obrigada”, alguns aplausos e gritos ecoando na atmosfera aos finais dos acordes.
     Papeis de guardanapos com pedidos vêm chegando aos poucos, desafiando você e todo seu repertório. Um bêbado começa a cantar, desprovido de vergonha, livre e sem equilíbrio nas pernas.
     Algumas bochechas já rosadas, algumas pitucas são jogadas fora e no banheiro não tem água devido ao racionamento duvidoso de Brasília.
     Nesse calor de agora, “mas só chove, chove...”.
     O que se passa pela minha cabeça? “nossa... que sorriso lindo é esse?”
     O garçom veio trazer meu telefone que deixei carregando...
22h24min...
     Vejo alguns casais de mãos dadas e eu querendo fugir daqui com você agora. Músicas que estão a tocas mil corações e trazendo os corais de barzinho ao local.
     O violonista instalou-se numa viagem a um local desconhecido e ao solo, tocou todo o barzinho. Usou o dedo da vocalista como palheta e com suas 7 cordas. Brincou e cantou...
     Depois de uma pausa, o garçom trazia um bilhete “30 minutos para acabar”, dizia o papelzinho. Vou preparando a comanda para partir ao som de Fulgaz. O groove soa como um vento forte que falta aqui agora.
     A plateia sente que essa parte da noite chega ao fim e mesmo assim o ânimo não acaba. O samba não para, as frituras não param e lá atrás, outros cantam os novos baianos novamente.
     “Gente, muito obrigado... A gente vai ficando por aqui...”, “valeu gente, muito obrigado...”, “a saideeeeêra!”.
     E lá se vai o último som de hoje, deixando um gosto apaixonado no ar para todos os presentes, embolado num clássico potente do samba. “Escute o que vou lhe dizer, um minuto de sua atenção...”.
     Alguns vão levantando de suas cadeiras e mesas de madeira à um destino qualquer.
     23h45min... Cabe mais uma ainda e as pessoas não querem ver o final desse momento.
     Todos cantam o refrão em tom firme e meio embolado. Poucos murmuram, as baterias dos eletrônicos descarregam e os copos já estão vazios.
     “Não vejo a hora de te encontrar...” e um sorriso seu. “... mas também não tem certeza que sim. Quer saber...”.
     Mãos e braços vão ao alto. Olhos se fecham e o violão para agora se encontra, dando espaço para todos os vocalistas.
 “Deitado na mesa de um bar, reconheço o teu cheiro a chegar...”.



sapo_____________________________________14.10.2017